Historia

3. Capa do livro


Era uma vez uma aldeia pequena e bonita, rodeada de montanhas e com um campanário que se erguia acima das casas circundantes. E, precisamente ao pé do campanário, estava a casa onde vivia a heroína desta história.
Era  uma rapariguinha de nove anos, tão simpática como bela, e toda agente lhe chamava Capuchinho Vermelho porque, quando fez oito anos, a mãe tinha-lhe dado um lindo capuz escarlate que ela usava sempre que andava pela aldeia.
O pai de Capuchinho Vermelho era lenhador. Tal como o resto dos habitantes da aldeia, esta família não era rica, mas a madeira que o pai recolhia era o suficiente para lhes permitir viver desafogadamente. Porém, há já alguns dias que os lenhadores andavam um tanto inquietos pois tinham visto um lobo enorme vaguear pelo bosque, espalhando o medo entre o povo. Com aquele animal deambulando pelo mato, o seu trabalho tornou-se muito mais difícil.
Certa manhã, a mãe do Capuchinho cozinhou duas dezenas de tortas deliciosas e, quando estavam prontas, pensou que gostaria de as enviar à sua velha mãe, a avó de Capuchinho Vermelho, que vivia do outro lado da floresta.
Assim, chamou a filha e disse-lhe:
- Leva estas tortas à tua avó. Ouvi dizer que ela está um pouco adoentada e tenho a certeza que ficará satisfeita por saber que pensamos nela.
  Ah e leva também um pacote de manteiga da despensa!
Capuchinho Vermelho obedeceu imediatamente, arranjou o capuz em frente ao espelho e despediu-se da mãe, com as tortas e o pote nas mãos.
- E tem cuidado com o lobo! – Recomendou-lhe a mãe. – Não saias do caminho principal e volta depressa.
            Capuchinho Vermelho prometeu que assim faria, mas a verdade é que estava mal preparada para se defender do lobo pois nem sequer sabia como era essa personagem, de quem todos tinham medo. Assim, saiu da aldeia saltitando alegremente e parando de vez em quando para cheirar as flores à beira do caminho.
            E o que tinha de acontecer, aconteceu. O lobo estava escondido atrás de um bosque, com a barriga a dar horas de tanta fome. Acossado pelos lenhadores vigilantes, nas últimas semanas tinha-se alimentado de folhas e raízes, um tipo de refeição muito escassa para um carnívoro como ele. Por isso, mal sentiu o cheiro da carne fresca, nem pensou duas vezes e saltou ao caminho, mesmo em frente a Capuchinho Vermelho.
- Bom dia, menina! – Cumprimentou-a, lambendo os beiços, em antecipação. – Posso saber para onde vais?
            Capuchinho, inocente e confiante, não viu nada de mal nesta personagem. A única coisa em que reparou foi no facto de ser um pouco mais peludo que a maioria das pessoas.
- Vou a casa da minha avozinha – respondeu ela. – Ela está doente e vou-lhe levar umas tortas e um pacote de manteiga.
O lobo teve medo de a comer ali mesmo porque os lenhadores não estavam longe e, por isso, arranjou um estratagema.
- Sabes o que podíamos fazer? – disse. – Podíamos fazer um jogo!
- Maravilhoso! – disse Capuchinho Vermelho, batendo as palmas. – Gosto muito de jogos!
- Onde vive a tua avozinha?
- No outro lado do bosque, numa casa com telhas castanhas.
- Pois bem…Eu irei pelo caminho da esquerda, que é mais longo, e tu irás pelo outro, que é mais curto. Vamos ver quem chega lá primeiro!
            Capuchinho Vermelho concordou e o lobo não esperou nem mais um segundo; desatou a correr pelo caminho que tinha escolhido (que, como se está mesmo a ver, era o mais curto). Depressa chegou à cabana da avó, ainda Capuchinho ia a meio do caminho. Arfando por causa da corrida, o lobo bateu à porta.
- Quem é? – Perguntou a avó, de dentro.
- Sou a tua neta, Capuchinho Vermelho – disse o lobo, disfarçando a voz. – Trago-te tortas e manteiga que a mamã mandou.
            A avó levantou-se da cama, manquejando, para abrir a porta. Mas mal tinha ainda levantado o ferrolho e já o lobo se atirava a ela, derrubando-a. Tê-la-ia engolido imediatamente mas pensou na carne tenra de Capuchinho Vermelho e, como ela devia estar quase a chegar à cabana, preferiu guardar a avó para o caso de ainda ficar com fome.
            Num abrir e fechar de olhos, amarrou a avó, amordaçou-a e fechou-a num armário. Depois, vestiu uma velha camisa de dormir e pôs uma toca na cabeça, meteu-se na cama e ficou à espera, cheio de impaciência.
            Entretanto, a pequena Capuchinho Vermelho não tinha pressa nenhuma. Os bosques estavam repletos de coisas maravilhosas; uma linda flor ou um esquilo brincalhão, tudo era motivo para a menina perder a noção do tempo. Por isso, quando bateu à porta da cabana, já tinha esquecido a peluda personagem.
- Quem é? – Perguntou o lobo, lá de dentro, imitando a voz da avó.
            À medida que se ia acostumando à obscuridade, Capuchinho Vermelho começou a notar que a avó tinha um aspecto estranho.
-Avó, tens umas orelhas tão grandes! – disse.
O lobo tentou escondê-las melhor, debaixo da touca.
- São para te ouvir melhor! – respondeu.
- E os olhos…Que grandes que são!
- São para te ver melhor, minha querida.
Então, Capuchinho Vermelho reparou na enorme boca e dentes e inclinou-se, aproximando-se da cabeça do animal.
- Que boca e que dentes tão grandes tu tens, avozinha!
- Vamos acabar com esta conversa tola! – gritou o lobo. – Estes dentes tão grandes são para te comer melhor!
            E, atirando-se à menina, engoliu-a num ápice, sem sequer mastigar.
Satisfeito e contente, passando a mão pela barriga enorme, finalmente cheia, o lobo cambaleou até um lugar fresco onde pudesse digerir o petisco em paz.
            Um pouco mais tarde, o pai de Capuchinho Vermelho, acompanhado por outros dois lenhadores, calhou de passar pela cabana da avó e decidiu entrar para a cumprimentar. Depressa deu com ela, debatendo-se dentro do armário.
- Que grande desgraça, que grande desgraça!
-Repetia a boa da mulher. – O lobo comeu a tua filha e eu nada pude fazer para o evitar!
            Louco de fúria, o pai de Capuchinho Vermelho lançou-se em perseguição da fera, disposto a encontrar o seu esconderijo. E, embora as lágrimas que vertia pela filha perdida lhe cegassem os olhos, não demorou mais de meia hora a encontrar o lobo. Estava deitado de papo para o ar, com as costas apoiadas a uma árvore e ressonava ruidosamente.
- Esta será a última maldade que fazes! – disse o lenhador.
            E, levantando o seu machado, preparava-se para o abater sobre a cabeça do lobo. Mas algo o fez parar. Era uma vozita que parecia chamar, do interior do estômago do lobo. E a voz dizia:
- Socorro! Socorro! Será que ninguém me tira daqui?
O lenhador reconheceu a voz da filha.
Capuchinho Vermelho estava viva!
            Então, muito cuidadosamente, começou a cortar a pele da barriga do lobo até que viu aparecer Capuchinho, muito assustada e trémula.
-Papá, que medo que eu tive! – A menina atirou-se nos seus braços.
O pai compreendeu o que tinha acontecido. O lobo tinha engolido Capuchinho Vermelho sem a mastigar e, afortunadamente, ele tinha chegado a tempo. E, graças ao entorpecimento provocado ao lobo pela digestão, este nem sequer tinha sentido que o seu estômago estava aberto.
- Corre para a aldeia e diz a toda agente que não precisam de se preocupar mais com o lobo! – disse o lenhador à filha.
            Capuchinho Vermelho foi-se embora e o lenhador encheu a barriga do lobo com grandes pedras e coseu cuidadosamente o animal, que continuava a dormir como se nada fosse.
Ao fim da tarde, o lobo acordou e quando tentou pôr-se em pé, voltou a cair por causa do grande peso que tinha na barriga.
 - A rapariguinha não me caiu muito bem! – disse. – E eu que julgava que a carne dela era mais tenra que a de um carneirinho!
            Cambaleando o melhor que podia, dirigiu-se para a margem do rio. Precisava de beber água para matar a enorme sede que sentia. E o que ele bebeu! Mal tinha mergulhado o focinho no rio, o peso das pedras fê-lo tombar para a frente e ele mergulhou no rio. Já não conseguiu voltar a sair, afogou-se e ficou no fundo.
            A partir daí, a paz voltou a reinar nos bosques e os lenhadores podiam trabalhar sem receio. Quanto a Capuchinho Vermelho, desde esse dia que passou a saber como era um lobo, se bem que, felizmente não voltou a encontrar nenhum no seu caminho.